top of page

Gatos Treinados são mais Otimistas

E se lhe disséssemos que um gato treinado pode ser mais otimistas? Provavelmente vão surgir duas perguntas na sua cabeça: “Os gatos podem ser treinados?” ou “Como é que o treino torna um gato num animal mais otimistas?”.


Estivemos à conversa com Sara Fragoso (SF) e Ana Pereira (AP). Sara é bióloga e uma das fundadoras do CPCA (Centro para o Conhecimento Animal) e Ana é finalista do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária da Universidade de Évora. Juntas desenvolvem este estudo que iremos apresentar.


Quais são os principais objetivos deste estudo?

SF: Com este estudo pretendemos avaliar os benefícios do treino positivo no estado emocional dos gatos. Este estudo está integrado num projeto mais amplo em que gatos do Centro de Recolha Oficial (CRO) de Sintra são treinados. Os objetivos principais deste projeto são contribuir para o bem-estar e promover a adoção destes animais. O treino é o meio utilizado para este fim, uma vez que constitui uma excelente ferramenta de estimulação cognitiva e facilita o contato com seres humanos. São momentos em que as capacidades de ambas as espécies são postas à prova. Comunicação, concentração e diversão são os ingredientes necessários para que novos comportamentos sejam aprendidos. Esperamos assim ter gatinhos psicologicamente mais saudáveis e mais adotáveis.


Com o estudo que a Ana está a desenvolver pretendemos demonstrar cientificamente a diferença do ponto de vista emocional entre gatos treinados e não treinados. É expectável que gatos treinados se encontrem com um estado emocional mais positivo e, por isso, sejam mais otimistas. Basicamente os gatos são ensinado a discriminar dois tipos de estímulos (2 locais distintos) e, posteriormente, é-lhes apresentado um estímulo ambíguo, isto é, com características intermédias (localização intermédia). A diferença entre os dois estímulos (locais) é o fato de ter ou não acesso a algo bastante palatável. Um gato otimista tenderá a reagir ao estímulo ambíguo, com o qual não tem qualquer experiência anterior, como se de algo de positivo se tratasse, isto é, aproxima-se desse estímulo com a expectativa de encontrar a guloseima. Por sua vez, um gato pessimista, tenderá a responder a um estímulo ambíguo de forma desinteressada.


Se a nossa hipótese principal se verificar, confirma-se a importância de proporcionar um ambiente rico e estimulante aos nossos gatos para que sejam mais felizes, sendo o treino uma forma de alcançar esse fim.


AP: De uma forma muito geral talvez possamos dizer que é avaliar o estado emocional dos gatos no gatil de Sintra, e consequente o bem-estar dos mesmos, tentando avaliar a presença de diferenças quando proporcionamos diferentes níveis de enriquecimento ambiental (treino, brincadeira ou apenas o mínimo de interação possível).


Como surgiu a ideia de fazer este estudo?

SF: A Ana, como finalista do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária da Universidade de Évora, contactou-me para ser sua co-orientadora e fazer o estágio de conclusão de curso no âmbito deste projeto no CRO de Sintra, dado o seu interesse em aprender e desenvolver trabalho na área do comportamento e bem-estar animal. Entre várias possibilidades, sugeri que fizesse este estudo por ser uma abordagem ainda pouco utilizada na avaliação do bem-estar animal. Apesar de não ser um trabalho fácil e que implica bastante dedicação, a Ana aceitou o desafio!


AP: A minha ideia sempre foi realizar estágio na área do Comportamento Animal e Bem- Estar, por ser uma área que me agrada particularmente e, também, uma área ainda pouco divulgada/desenvolvida no âmbito, não só do ensino na Medicina Veterinária (pelo menos na minha Universidade), como também ao nível profissional. Detetei, ao longo do curso, uma grande falha no estudo desta área sendo a área clínica quase exclusivamente a estudada, encontrando "sequelas" disso ao nível dos clínicos que tive oportunidade de ver trabalhar ao longo do curso.

Discutimos juntas (Ana e Sara) várias hipóteses que me foram surgindo e à Sara. Um dos temas que nos surgiu foi o Viés Cognitivo, algo de que eu nunca tinha ouvido falar, que me pareceu muito interessante e útil no "patamar" em que o nosso país me parece estar, seja ao nível da Medicina Veterinária e de todos os profissionais envolvidos nesta área, seja ao nível da opinião pública geral dos donos de animais.


O que é o Viés Cognitivo?

AP: O viés cognitivo, tentando simplificar ao máximo, é uma ferramenta que pretende ajudar na avaliação do bem-estar animal, tentando mostrar qual o estado emocional desse animal, dando alguma informação sobre se é mais positivo ou negativo. Assim, podemos usar esta ferramenta, por exemplo, em animais que, estando em circunstâncias consideradas semelhantes, introduzimos determinadas diferenças no seu ambiente (enriquecendo-o mais ou menos, por exemplo) e avaliarmos se essas diferenças reproduzem resultados diferentes, perante o uso dessa ferramenta.


Quem está envolvido neste estudo?

SF: Essencialmente eu e a Ana. No entanto, temos a ajuda de algumas pessoas que colaboram pontualmente.


Quais são as etapas do estudo?

SF+AP: Na 1ª fase os gatos são ensinados a entrar na transportadora a partir da jaula onde vivem e, quando já entram com relativa facilidade, são levados para a sala onde vão ser realizadas as restantes fases do estudo. Essa fase dura 2 a 3 dias. O grupo a que cada gato vai pertencer é sorteado (grupos: treino, brincadeira ou sem estímulos). Nesta fase são levados à sala e, durante 30 minutos, são treinados ou brincamos com eles ou simplesmente deixamo-los estar na sala. Essa fase dura cerca de 2 semanas.


A 2ª fase consta de uma habituação a toda a manipulação que o teste exige. Dura cerca de 3 a 5 dias conforme o gato atinja os critérios definidos ou não.


A 3ª fase, então o treino para o teste, consta da aprendizagem pelo gato, necessária à realização do teste. O animal necessita de aprender a distinguir o local específico onde se pode dirigir (pois vai encontrar comida se a taça lá aparecer), do local, diametralmente oposto, onde não vale a pena dirigir-se quando a taça lá surge, pois não terá acesso à comida. Essa fase dura entre 3 a 9 dias, conforme o gato necessite de mais ou menos tempo para aprender a discriminar os estímulos.


Finalmente a 4ª fase, o teste, consta de 3 dias em que apresentamos ao gato, além dos 2 locais já aprendidos como tendo ou não comida quando lá surge a taça, mais 3 locais intermédios onde o gato terá de decidir se vale a pena tentar ir à taça ou não ver se lá tem comida disponível.


Quais são os gatos escolhidos para este estudo?

SF: A seleção dos gatos é aleatória. No entanto, gatos que tenham problemas de saúde não entram no estudo, uma vez que esta condição poderia influenciar os resultados. Caso apresentem medo ou agressividade dirigida a pessoas, antes de serem incluídos no estudo, têm que passar por um processo de modificação comportamental para que deixem de ver as pessoas como uma ameaça.


Interessado em conhecer os resultados deste estudo? Este será um projeto que a M.A.D.E continuará a acompanhar. Não perca os próximos “episódios”!

bottom of page