Ser apenas um entre milhares. Não ser mais importante, não ser melhor, não ser especial. Não ser amado por outro, não ser amado em exclusivo. Porque nos inquieta, deprime, revolta esta ideia? Que necessidade básica é esta a de pertencer a alguém, a de ser validado. Porquê querer ser validado por uma pessoa que seja entre milhares? Porque se formos amados por uma pessoa em especial, mesmo que ela seja apenas mais uma pessoa não tão especial entre mil, nos faz sentir que tudo está bem? Porque procuramos o amor único e incondicional e nunca nos chega o amor próprio?
Queremos ser amados pela nossa mãe, pelo nosso pai, que nos fazem sentir únicos e especiais na infância e depois isso já não nos chega. Precisamos da aceitação de todos e do amor de alguém. No entanto sabemos que não somos especiais. Somos únicos sim. Mas não somos especiais.
Olhem para um casal com a prespetiva de quem vê de fora. Como são especiais um para o outro, como se sentem felizes por se amarem, por serem tudo um para o outro. E no entanto, para vocês, nem um nem outro são nada. Visto pela perspetiva deles, é uma ilusão. Sentem-se validados um pelo outro por se sentirem escolhidos entre esses milhões de pessoas, quando são fruto de uma sucessão de acasos. Não são um entre um milhão mas um entre um grupo de pessoas conhecidas em circunstâncias favoráveis.
Não. Não sou contra o amor. Nem o desacredito. Quero, pelo contrário, defendê-lo. Aquele amor verdadeiro, o incondicional e puro. O que achamos é que ser amados nos torna especiais. Pelo menos para essa pessoa, sim. Mas e se ela amar outra pessoa? Aí sentimos exatamente o contrário. Sentimo-nos traídos, enganados, que já não somos especiais. Queremos acreditar que somos um num mihão, e se somos amados em conjunto com outra pessoa isso faz de nós apenas mais um! O amor é puro, livre, universal. Os nossos desejos de companheirismo, exclusividade, relação a dois por definição socialmente comum, nada têm a ver com o amor. E é essa separação que prejudica o conceito mais puro. O amor acontece do mais puro que temos. Não escolhe pessoas pelo que são mas porque uma energia se encontra. O amor é vasto, é abranjente, dá tudo e não escolhe nada. Posso amar uma pessoa. Posso amar duas. Posso amar todas. Posso amar o mundo inteiro. Amo a mãe, o pai, o amigo, o namorado, o ex-namorado, o amante, o olhar do desconhecido, o filho, a avó, a prima, as pessoas bonitas por dentro, as que vi a alma nos olhos. Amo as que ainda não conheci. Amo todas e nenhuma menos. Todas são especiais para mim e nenhuma em detrimento de outra. E nenhuma é mais especial por que eu a amo.
A necessidade? Bom, perguntem a Freud talvez. Essa vem da condição humana. Da fragilidade deste corpo e deste cérebro carnal.
Mas o amor? Esse é espiritual. Não respeita regras, não tem princípios, não escolhe condições nem restrições. Ele é. E ele dá-se. E dar amor e receber amor é das melhores experiências espirituais do ser humano.
Então dêem. Recebam. E nada mais.