Às vezes quero dizer o mundo, quero expressar-me, sinto que cada palavra pode fazer diferença, sinto que alguém tem que falar, que alguém tem que se mexer, que se ficarmos todos sem dizer aquilo que de facto sentimos nos vamos adormecendo uns aos outros no meio de “não ditos e quase que disse mas não disse”.
Às vezes parece-me inútil dizer o que quer que seja, cada palavra me parece vã, cada ação vazia, cada dia só mais um, cada cabeça sua sentença e nenhuma verdade, cada voz apela à beleza da sua loucura que só vê quem está fora, que quem está dentro vive a irreal realidade com a absoluta certeza de que assim é.
E o que dizer aqui? O que fazer aqui? O que esperar daqui? Se toda a loucura e sonho é a expressão mais íntima e familiar do homem-pessoa que sonha sem saber que está a sonhar. Não sou de roubar sonhos alheios, mas participo duns quantos só porque o meu sono tem padrões parecidos com sonos de outro alguém. E não há palavra que faça sentido, não há conceito que tenha correspondência, não há forma na matéria, não há nada para dizer, e mesmo que digas tudo não importa nada. Porquê falar ou silenciar? Porquê fazer som ou calar? Porque oscilas expressão entre estes dois postos que ninguém te incumbiu de ocupar. Se não falo é porque não tenho nada para dizer, porque não há sentido, porque não há nada, nem em falta nem para acrescentar. Mas quando não há nada, não há mesmo nada, não há o bom, porque também não há o mau e o tempo passa a uma velocidade diferente, como quem não se importa se já é tarde, cedo, ontem ou amanhã. É apenas sem ser nada. Mas falo. Há dias de som, dias que as palavras ganham força, dias que são iguais aos outros mas que são totalmente diferentes, dias difíceis, dias que põem o coração a acelerar, a descompassar, a parar… Às vezes pára mesmo. E não é que continuo aqui? Que dia é hoje?