StartFragmentAssisti certa vez a um documentário sobre as origens do Yoga. Nele tentava-se descobrir onde este tinha originalmente nascido, o seu propósito inicial, e porque era praticado. Além disso, e porque se tornou uma actividade tão popular, dava a conhecer novos tipos de derivações do yoga modernas, como Rave Yoga – yoga praticado ao som de musicas alternativas, com pinturas fluorescentes e luz negra, ou Yoga Cristão – Yoga despido de qualquer vestígio de mantras hindus, substituídos por salmos cristãos recitados na prática. A contrapor esta última versão, era entrevistado um católico que dizia não praticar yoga pois era associado a outra religião, e que evitava qualquer postura de yoga mesmo que por acidente, pois temia que isso pusesse algo em risco na sua devoção.
Temos então duas visões distintas – a adaptação de uma ideia de forma livre, e a defesa do fundamento ao extremo. Aqui tanto é verdade que o Yoga tem uma fundação espiritual/religiosa, como é verdade que a sua vertente de prática física (pois o Yoga é composto por muito mais elementos) foi adoptada e adaptada por muitos. Os seus benefícios continuam a existir mesmo dissociados da parte espiritual, assim como não teria malefício algum uma pessoa colocar o seu corpo em determinada posição, correndo o risco de ofender um outro deus.
A partir deste exemplo podemos falar de qualquer coisa. Religião, política, culinária, dança, jardinagem… Tudo tem um fundamento, uma origem, um propósito inicial. É importante conhecê-lo. Mas quem o criou foi tão humano como nós. Podemos adoptar uma ideia, um modo de vida, fazê-lo nosso. Mas podemos impô-lo aos outros? Temos o direito de achar que o que nós pensamos (que é o mesmo que alguém noutro dia pensou) é o único modo correto de pensar? Tudo bem. O Yoga nasceu de uma maneira. Mas e se eu quiser para a minha felicidade misturar Yoga com Kick Boxing (que existe, para que conste), não estarei no meu livre direito? Não é para isso que o Yoga nasce, isso pode até contrariar os seus princípios. Mas quem quiser pode segui-lo na forma original. E quem quiser pode misturar o que o fizer mais feliz. Talvez possa não lhe chamar yoga, ou kick boxing, mas uma mistura dos dois.
Podemos ter a nossa opinião sobre o correto ou o incorreto. Mas não devemos ser extremistas ou julgar os outros nas suas escolhas e o que os faz feliz. Se isso não interferir na nossa liberdade, porquê interferir na dos outros? Se eu praticar uma outra religião e alguém achar que eu vou arder em algum inferno por isso, a preocupação não devia ser minha? Você está assim tão preocupado com o meu bem estar? Ou quer apenas o mundo à sua imagem?
Existe uma frase que aprecio bastante que diz “Qualquer que seja o Deus em que acreditas, rezamos todos ao mesmo”. Qualquer que seja o caminho ou a forma escolhida, no fundo se Deus é um só estamos todos a falar com o mesmo. E assim como todos os caminhos. Cada um segue o que o faz mais feliz e o que lhe parece melhor à sua imagem e modo de pensar. Não sabemos porque não há ninguém que nos diga, que essa forma é a correta. Então teremos de viver e deixar viver.
O amor, a liberdade, a saúde, esses e outros são, sim, valores universais. A esses sim, agarremo-nos com extremismo. É difícil. Muito difícil. Se temos as nossas crenças é porque também tivemos de fazer uma escolha e tomar uma decisão porque achámos que essa era a melhor. Então como evitar a tendência de querer fazer ver aos outros o nosso ponto de vista? Eu própria não praticando nenhuma religião tenho tendência a ter um sentido crítico para com todas elas. Respeito e não me ofende nem nunca será um conflito para mim. Mas é quase incontrolável a vontade de entrar em debate.
Mais uma vez, procuremos antes os valores em comum. Seja indo à igreja, abraçando árvores ou rezando mantras, se o caminho é encontrar a paz, então que sigamos os nossos diferentes caminhos e encontremo-nos no mesmo destino. A defesa de algo ao extremo será sempre limitadora. No entanto tudo tem sempre duas versões, ou mais. Diversos pontos de vista. E como me disse alguém “todo o ponto de vista é visto de um ponto”.EndFragment