Com ou sem pretensões espirituais, com ou sem conhecimentos sobre consciência, Deus, inteligência universal, todos experimentamos a sensação de "querermos ser nós". Se por um lado a expressão em si é absurda "querer ser eu", já que para a afirmarmos temos de, primeiro, SER, expressar este desejo de se ser o que já se é parece uma vontade inerente a ser humano. Ora, querer ser eu, implica um eu que já é, mas que sabe em si, através de alguma força maior que não é bem aquilo que imagina, sente ou tem percepção de, como se algo faltasse no contexto maior, como se algo soubesse que há mais do que parece haver. Esta sensação de "querer ser eu" leva-nos em buscas de roupagens que nos sirvam como representações mais próximas deste eu que queremos ser. Estas roupagens surgem de várias formas: com carreiras profissionais, com roupas, com relacionamentos, com idas a sítios específicos, com grupos de amigos de determinadas características, com palavras "sábias" que nos saem da boca e dos poros em defesa do projecto em construção deste alguém a que queremos chegar.
"Ser eu" - esta expressão implica na mente de muitos humanos apenas e só uma ideia, uma aspiração, um conceito, uma imagem, um sonho. Atrás de ideias, imagens e sonhos por sonhar vivem os humanos entretidos numa viagem em que o destino se move, afasta e modifica a cada episódio de vida. O destino move-se porque não estava lá à partida, nunca existiu naquele tempo e espaço, esse destino, esse ser que queremos ser nunca existirá... porque nunca existiu. Foi apenas um projeto mental, um conjunto de ideias, uma projeçao, uma qualquer fé estranha em que o universo se moldaria ao nosso próprio gosto e para nosso próprio prazer, para, finalmente, nos sentirmos o "nós" que merecemos e trabalhámos para.
Como explicar a uma sociedade que vive focada em atingir, em alcançar, em aspirar em ser este alguém que esta busca é totalmente imaginada? Como abrir o coração de quem tem a bandeira da vitória hasteada na mente e nas suas projeções? Por outro lado... às vezes questiono-me é como é que isto não acontece sozinho em todos os seres? Temos que ser muito teimosos e obececados com as nossas ideias para não ver que perseguimos fantasmas, que qualquer perseguição é em si cansativa, e se o alvo é inexistente, é no mínimo uma batalha perdida.
Que ironia esta a de tentar ser aquilo que já se é. Se não quiseres ser nada... o que te falta? Porque queres tanta coisa se sabes que ao tê-las já não as queres ou inventas outras? Se tens este alimento porque desejas outro? Porque acreditas que te falta algo e que tens que te esforçar por ser alguém? Quem te disse? Porque achas que não estás bem como estás? Se existes... porque lutas por existir? Se já és... porque tentas ser?